quarta-feira, 7 de setembro de 2011

ROUSSEAU

Compreender o pensamento de Rousseau nos ajuda a ler muitos dos discursos presentes até os dias atuais na educação. O vídeo sobre Rousseau, esta no site: http://portal.filosofia.pro.br/.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

FILME ALEXANDRIA


Que tal, preparar uma bacia de pipoca, aconchegar-se num sofá ou na cama e deliciar-se com o filme ALEXANDRIA.


“Se toda estrela cadente cai pra fazer sentido
E todo mito quer ter carne aqui.
A ciência não se ensina.
A ciência insemina, a ciência em si.”
Arnaldo Antunes e Gilberto Gil



A linguagem cinematográfica tem a capacidade de projetar e antecipar dramas, ficções e revoluções, de debater temas banais e polêmicos e de revisitar o passado. Aqui convidamos o leitor a envolver-se num roteiro que data do ano de 391 d.C., início do cristianismo na história do ocidente.

A temática do filme Alexandria remonta os discursos e a cultura do início da idade média, conduzindo-nos a construção imagética do espaço e do tempo histórico e nos remetendo ao passado como se este fosse passível de ser revivido. O filme trata das concepções relacionadas ao o conhecimento, ao papel da mulher, as experiências com a matemática, com a filosofia, com a astrologia e com as relações de poder, bem como apresenta o processo do trabalho científico, testemunhando o movimento que abriga a pesquisa, a dúvida, a frustração, as descobertas na busca de respostas para a sua pergunta.

Dessa forma, enxergamos a história se colorindo em nossa retina. Os cenários do filme são elaborados a cada diálogo, imagens que até então só existiam na iconografia dos livros de história e na elaboração imagética de nossas leituras passam a ser quase reais. O decorrer da narrativa nos encanta e impacta ao mesmo tempo, bem como nos compromete a refletir sobre a herança cultural e ideológica e sobre as conseqüências destas na nossa sociedade.

O filme aborda o valor da ciência por duas características: a primeira é ser fonte de inquietação intelectual e a segunda é ter o poder de revolucionar as verdades e as crenças de uma época. Nessa perspectiva o filme tece seu roteiro através dos conflitos de poder, dos debates filosóficos e da narrativa religiosa retratando a história da filósofa Hypatia.

Dessa forma, atravessamos a fronteira do tempo e ancorado na contemporaneidade ainda percebemos a intolerância, o preconceito entre gênero, a propagação das verdades absolutas e a alienação. Na área da educação as rupturas e reflexões representam o caminho para superação desta limitação do pensamento linear e fechado. Reconhecemos portanto, a relevância do avanço do ensino memorístico e livresco para o ensino reflexivo e participativo; vale, portanto salientar a importante instrumentalização do aluno para pensar criticamente sobre as ciências, sobre as perguntas cotidianas e sobre os processos históricos.

Talvez esteja aí a resposta para a crise na educação, trata-se de uma crise de paradigma, em que a humanidade se deparou com a crise das verdades, que tiveram em toda história da humanidade sempre um caráter metafísico. O que fazer diante desse sentimento de fragilidade da condição humana? (PEREIRA & ARAUJO, 2009, p. 61)

Um processo de educação renovada anuncia que as verdades não são imutáveis e fechadas, elas podem estão em constante reelaboração, são por vezes incompletas e não falhas. Assim a apropriada revolução implica em efetivar a busca continua de caminhos dessa forma é preciso formar um aluno consciente, o foco deste artigo é iniciar o debate sobre o ensino a partir do aporte teórico da pedagogia histórico - critica.

A tendência da pedagogia critico social de conteúdos propõe uma síntese superadora das pedagogia tradicional e renovada, valorizando a ação pedagógica enquanto inserida na prática social concreta. Entende a escola como mediação entre o individual e o social, exercendo aí a articulação entre a transmissão dos conteúdos e a assimilação ativa por parte de um aluno concreto (inserido num contexto de relações sociais); dessa articulação resulta o saber criticamente re-elaborado. (LIBANEO, 2002, p. 21)

O roteiro do filme é povoado de imagens que nos remetem a temas polêmicos e contemporâneos, todavia o nosso interesse localiza-se principalmente em refletir sobre as concepções de ensino, sobre os textos presentes na sala de aula, sobre como são tratados os conteúdos tna sal de aula, se há espaço nas aulas para a perspectiva critica e reflexiva.

Embora se aceite que os conteúdos são realidades exteriores ao aluno, que devem ser assimilados e não simplesmente reinventados, eles não são fechados e refretários às realidades sociais. Não basta que os conteúdos sejam apenas ensinados, ainda que bem ensinados; é preciso que se liguem, de forma indissociável, à sua significação humana e social. (LIBANÊO, 2000, p. 30)

A educação com bases cartesianas denota um ensino acrítico, às voltas com a uma imagem linear, obedecendo a ideia mecânica do pensamento, com suas verdades fragmentadas, sem tratar com a devida atenção as rupturas, os conflitos e os processos de superação que o pensamento atravessa no campo das concepções. Dessa forma, a tendência tradicionalista do ensino tem permanecido viva entre professores e alunos; tendo como conseqüência direta um ensino ahistórico e acritico.

Assim, essas concepções aparecem associadas entre si, como expressão de uma imagem global ingênua da ciência que se foi decantando, passando a ser socialmente aceite. De fato, essa imagem típica da ciência parece ter sido assumida por autores do campo da educação, que criticam como características da ciência aquilo que são apenas visões deformadas da mesma. (CACHAPUZ, 2009, p 134)

Por tanto, escolhemos dialogar sobre o ensino através da Pedagogia histórica-crítica (doravante PHC), fomentando a reflexão sobre a importância do papel do professor, sobre o significado de um ensino crítico e com sobre a função social da educação. Bem como desmistificar as imagens distoricidas sobre o mundo do conhecimento, tais como: o da ciência relacionada aos gênios, aos laboratórios mágicos e luminosos, aos cientistas “imaculados”, a idéia de inteligência ligada a postura de anti-social, cremos que na medida que nos afastarmos de preconceitos tendenciosos e dos interesses de grupos sociais dominantes, nos aproximaremos do ensino transformador.

As grandes transformações são morfogêneses, criadoras de formas novas que podem constituir verdadeiras metamorfoses. De qualquer maneira, não há evolução que não seja desorganizadora/reorganizadora em seu processo de transformação ou de metamorfose. (MORIN, 2002 , p.82)


Tecemos a reflexão introdutória do artigo defendendo o ensino na perspectiva PHC, e pretendemos apresentar um debate sobre a trama de ideias apresentadas no filme Alexandria, objetivando debater uma educação capaz de formar um cidadão atuante que se posiciona criticamente diante dos temas sócio-científicos.

Uma sugestão de leitura: SAINT-EXUPÈRY

Esta obra de Saint-Exupéry, “Terra dos Homens”, é um romance em grande medida autobiográfico, sobre as aventuras que o autor vive após tornar-se piloto viajando para inúmeros lugares, entre eles, para o continente africano, Argentina, etc.
Expressa claramente o conhecimento que resultou de sua vivência logo na sua introdução: “Mais coisas sobre nós mesmos nos ensina a terra que todos os livros. Porque nos oferece resistência. Ao se medir com um obstáculo o homem aprende a se conhecer; para superá-lo, entretanto, ele precisa de ferramenta. Uma plaina, uma charrua. O camponês, em sua labuta, vai arrancando lentamente alguns segredos à natureza; e a verdade que ele obtém é universal”.

O autor

Nascido em 29 de junho de 1900 em Lyon, França, Antoine Marie Roger de Saint-Exupéry estudou no colégio jesuíta de Notre-Dame de Saint-Croix, em Mans entre 1909 e 1914. Devido à Primeira Guerra Mundial se transferiu-se para uma escola na Suíça onde permaneceu até 1917.
Em 1921, tornou-se piloto civil em Rabat. Em 1926, por indicação de um amigo, tornou-se piloto de linha voando entre as cidades de Toulouse, Casablanca e Dacar.

Publicou seu primeiro livro, Courrier Sud em 1928, escrito na África. Seguiu publicando livros e trabalhando como piloto. Acompanhou a guerra civil espanhola como repórter. Em 1939, surgiu o seu livro mais famoso, “Terra dos Homens”, à beira da Segunda Guerra Mundial. Este livro ganhou o Grande Prêmio de Literatura da Academia Francesa.
Em seguida, foi chamado a trabalhar como técnico durante a guerra. A seu pedido tornou-se piloto de um grupo de reconhecimento aéreo. Em 1942, publicou “Piloto de Guerra”. Em 1944, foi incorporado num grupo americano de reconhecimento. Após afastamento do serviço militar, se retirou em Argel dedicando-se a matemática e aos manuscritos de Citadelle. Retornou como comandante com um limite de cinco missões. Após isso, é novamente retirado do serviço a contra-gosto. Em 31 de julho de 1944 se matou jogando-se ao mar.

Fonte: http://www.pco.org.br/conoticias/ler_materia.php?mat=2870

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Boaventura de Sousa Santos - Folha de São Paulo


16/08/2011

Boaventura de Sousa Santos: O caos da ordem

Em Londres, estamos perante a denúncia violenta de modelo que tem recursos para resgatar bancos, mas não os tem para uma juventude sem esperança

Os motins na Inglaterra são um perturbador sinal dos tempos. Está a ser gerado nas sociedades um combustível altamente inflamável que flui nos subterrâneos da vida coletiva sem que se dê conta.
Esse combustível é constituído pela mistura de quatro componentes: a promoção conjunta da desigualdade social e do individualismo, a mercantilização da vida individual e coletiva, a prática do racismo em nome da tolerância, o sequestro da democracia por elites privilegiadas e a consequente transformação da política em administração do roubo "legal" dos cidadãos. Cada um dos componentes tem uma contradição interna.
Quando elas se sobrepõem, qualquer incidente pode provocar uma explosão de proporções inimagináveis. Com o neoliberalismo, o aumento da desigualdade social deixou de ser um problema para passar a ser a solução.
A ostentação dos ricos transformou-se em prova do êxito de um modelo social que só deixa na miséria a maioria dos cidadãos porque estes supostamente não se esforçam o suficiente para terem êxito.
Isso só foi possível com a conversão do individualismo em valor absoluto, o qual, contraditoriamente, só pode ser vivido como utopia da igualdade, da possibilidade de todos dispensarem por igual a solidariedade social, quer como agentes dela, quer como seus beneficiários.
Para o indivíduo assim construído, a desigualdade só é um problema quando lhe é adversa; quando isso sucede, nunca é reconhecida como merecida. Por outro lado, na sociedade de consumo, os objetos de consumo deixam de satisfazer necessidades para as criar incessantemente, e o investimento pessoal neles é tão intenso quando se têm como quando não se têm.
Entre acreditar que o dinheiro medeia tudo e acreditar que tudo pode ser feito para obtê-lo vai um passo muito curto. Os poderosos dão esse passo todos os dias sem que nada lhes aconteça. Os despossuídos, que pensam que podem fazer o mesmo, acabam nas prisões.
Os distúrbios na Inglaterra começaram com uma dimensão racial. São afloramentos da sociabilidade colonial que continua a dominar as nossas sociedades, muito tempo depois de terminar o colonialismo político. Um jovem negro das nossas cidades vive cotidianamente uma suspeição social que existe independentemente do que ele ou ela seja ou faça.
Tal suspeição é tanto mais virulenta quando ocorre numa sociedade distraída pelas políticas oficiais da luta contra a discriminação e pela fachada do multiculturalismo.
O que há de comum entre os distúrbios da Inglaterra e a destruição do bem-estar dos cidadãos provocada pelas políticas de austeridade comandadas por mercados financeiros? São sinais dos limites extremos da ordem democrática.
Os jovens amotinados são criminosos, mas não estamos perante uma "criminalidade pura e simples", como afirmou o primeiro-ministro David Cameron.
Estamos perante uma denúncia política violenta de um modelo social e político que tem recursos para resgatar bancos e não os tem para resgatar a juventude de uma vida sem esperança, do pesadelo de uma educação cada vez mais cara e mais irrelevante, dados o aumento do desemprego e o completo abandono em comunidades que as políticas públicas antissociais transformaram em campos de treino da raiva, da anomia e da revolta.
Entre o poder neoliberal instalado e os amotinados urbanos há uma simetria assustadora. A indiferença social, a arrogância, a distribuição injusta dos sacrifícios estão a semear o caos, a violência e o medo, e os semeadores dirão amanhã, genuinamente ofendidos, que o que semearam nada tem a ver com o caos, a violência e o medo instalados nas ruas das nossas cidades.
BOAVENTURA DE SOUSA SANTOS, sociólogo português, é diretor do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra (Portugal). É autor, entre outros livros, de "Para uma Revolução Democrática da Justiça" (Cortez, 2007).

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Belo texto de Juremir Machado da Silva


O que muda com a crise?

Por Juremir Machado da Silva


Muda a própria ideia de crise. Até agora, pensamos a crise como uma ruptura. Ao longo do tempo, vivemos as crises como um colapso. De repente, somos obrigados a pensar as crises como continuidade. De certa maneira, como algo complementar e antagônico. Em outras palavras, uma ruptura contínua ou uma continuidade com permanentes rupturas. A crise é antes de tudo comportamental. Mudou a forma de se comportar em sociedade. Segundo o pensador francês Gilles Lipovetsky, passamos de uma moral do sacrifício para uma sociedade pós-moralista. Não se trata de um mero jogo de palavras, mas de uma realidade que diz respeito ao estar no mundo, ao modo de ser, à relação com o outro. Em lugar de uma moral imperativa e pretensamente única, entramos numa flexibilização moral. Alguns valores são incontornáveis e universalizados. Outros - a maioria - dependem dos indivíduos e cada um está livre para aderir ou não. Estamos mais livres, mais soltos, mas céticos, até mesmo mais cínicos, mas também certamente mais responsáveis. É o que Lipovetsky chama de individualismo responsável. Ao contrário do que anunciam os alarmistas, nunca estivemos tão preocupados com limites e grandes valores: ecológicos, familiares, culturais. Luc Férry já mostrou que, atualmente, só se aceita morrer por um ente querido, por alguém da família, por um amor. Não se aceita mais morrer por entidades abstratas, a pátria, o dever, etc. Isso, obviamente, em se tratando de sociedade ocidental. Em paralelo, quase como uma reação, crescem as perspectivas nacionalistas, xenófobas, as guerras de religião, os fanatismos. Nossa sociedade é paradoxal. A crise é também a crise de uma ideia de verdade que jamais apresentou a prova da sua prova, o atestado final da sua veracidade. Estamos em crise. Estamos vivendo. Estamos mudando. Estamos nos reconstruindo.

Juremir Machado da Silva é professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, onde coordena o Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social. Graduado em história e eum jornalismo pela PUCRS (1984), doutor em sociologia pela Universidade Paris V, René Descartes, Sorbonne (1995), sob orientação de Michel Maffesoli.

Fonte: http://luz.cpflcultura.com.br/o-que-muda-com-a-crise-,16.html

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Memórias!



SINTA SEMPRE O SABOR DA VIDA QUE SE MANIFESTA A CADA INSTANTE E SE TIVER A CHANCE RELEMBRE ANTIGOS SABORES, É EXUBERANTE VOLTAR A SENTIR O GOSTO DO QUE JÁ NOS DEIXOU SEM PALAVRAS.

Biquini Cavadão

Quem disse que o tempo tem que ter utilidade
Tempo não é algo que se compra ou se produz
Está dentro de nós, da nossa vontade
Viver só vale a pena quando provoca saudade
De querer fazer de novo só porque é bom

Sempre que puder
Vou querer saber o sabor
Do que é bom na vida
Ter prazer ou dor
Seja lá o prêmio que for
Eu vou querer saber o sabor

A simplicidade das coisas me seduz
O céu fica mais lindo quando falta luz
Inventar desenhos na forma de uma nuvem
Olhar a noite inteira a lua passear no ceu
Até não se dar conta que o tempo passou


Sempre que puder
Vou querer saber o sabor
Do que é bom na vida
Ter prazer ou dor
Seja lá o prêmio que for

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Para um amigo!



O luto precisa de silêncio, calma, tempo para cicratizar. Ficamos frágeis e pequenos diante da partida de quem amamos, implodimos dia-a-dia com perguntas, lembranças, dúvidas e saudades. No entanto, a fé e o amor sagrado e misericordioso do Pai, cuida amorosamente desta dor intensa.

Dedicamos a o texto do autor Léo Buscaglia: A HISTÓRIA DE UMA FOLHA, a um amigo que está atravessando esse caminho. Também dedicamos a nossa amizade, nosso carinho e nossas orações.


A HISTÓRIA DE UMA FOLHA


Era uma vez uma folha, que crescera muito.
A parte intermediária era larga e forte, as cinco pontas
eram firmes e afiladas.

Surgira na primavera, como um pequeno broto num galho
grande, perto do topo de uma árvore alta.

A Folha estava cercada por centenas de outras folhas,
iguais a ela. Ou pelo menos assim parecia. Mas não demorou
muito para que descobrisse que não havia duas folhas iguais,
apesar de estarem na mesma árvore. Alfredo era a folha mais
próxima. Mário era a folha à sua direita. Clara era a linda folha
por cima. Todos haviam crescido juntos. Aprenderam a dançar à
brisa da primavera, esquentar indolentemente ao sol do verão,
a se lavar na chuva fresca.

Mas Daniel era seu melhor amigo. Era a folha maior no galho e
parecia que estava lá antes de qualquer outra. A Folha achava
que Daniel era também o mais sábio. Foi Daniel quem lhe contou
que eram parte de uma árvore. Foi Daniel quem explicou que
estavam crescendo num parque público. Foi Daniel quem revelou
que a árvore tinha raízes fortes, escondidas na terra lá embaixo.
Foi Daniel quem falou dos passarinhos que vinham pousar no
galho e cantar pela manhã. Foi Daniel quem contou sobre o sol,
a lua, as estrelas e as estações.



A primavera passou. E o verão também.

Fred adorava ser uma folha. Amava o seu galho, os amigos,
o seu lugar bem alto no céu, o vento que o sacudia, os raios do sol
que o esquentavam, a lua que o cobria de sombras suaves.

O verão fora excepcionalmente ameno. Os dias quentes e
compridos eram agradáveis, as noites suaves eram serenas
e povoadas por sonhos.

Muitas pessoas foram ao parque naquele verão. E sentavam sob
as árvores. Daniel contou à Folha que proporcionar sombra era
um dos propósitos das árvores.

- O que é um propósito? - perguntou a Folha.

- Um razão para existir - respondeu Daniel. - Tornar as coisas
mais agradáveis para os outros é uma razão para existir. Proporcionar sombra aos velhinhos que procuram escapar do
calor de suas casas é uma razão para existir.

A Folha tinha um encanto todo especial pelos velhinhos.
Sentavam em silêncio na relva fresca, mal se mexiam. E quando
conversavam eram aos sussurros, sobre os tempos passados.

As crianças também eram divertidas, embora às vezes abrissem
buracos na casa da árvore ou esculpissem seus nomes.
Mesmo assim, era divertido observar as crianças.

Mas o verão da Folha não demorou a passar.

E chegou ao fim numa noite de outubro. A Folha nunca sentira
tanto frio. Todas as outras folhas estremeceram com o frio.
Ficaram todas cobertas por uma camada fina de branco,
que num instante se derreteu e deixou-as encharcadas
de orvalho, faiscando ao sol..

Mais uma vez, foi Daniel quem explicou que haviam
experimentado a primeira geada, o sinal que era outono
e que o inverno viria em breve.

Quase que imediatamente, toda a árvore, mais do que isso,
todo o parque, se transformou num esplendor de cores.
Quase não restava qualquer folha verde. Alfredo se tornou
um amarelo intenso. Mário adquiriu um laranja brilhante.
Clara virou um vermelho ardente. Daniel estava púrpura.
E a Folha ficou vermelha, dourada e azul. Todos estavam lindos.
A Folha e seus amigos converteram a árvore num arco-íris.

- Por que ficamos com cores diferentes,
se estamos na mesma árvore? - perguntou a Folha.

- Cada um de nós é diferente. Tivemos experiências diferentes.
Recebemos o sol de maneira diferente. Projetamos a sombra de
maneira diferente. Por que não teríamos cores diferentes?

Foi Daniel, como sempre, quem falou. E Daniel contou ainda que aquela estação maravilhosa se chamava outono.

E um dia aconteceu uma coisa estranha. A mesma brisa que,
no passado, os fazia dançar começou a empurrar e puxar suas
hastes, quase como se estivesse zangada. Isso fez com que
algumas folhas fossem arrancadas de seus galhos e levadas pela
brisa, reviradas pelo ar, antes de caírem suavemente ao solo.

Todas as folhas ficaram assustadas.

- O que está acontecendo? - perguntaram
umas às outras, aos sussurros.

- É isso que acontece no outono - explicou Daniel -
É o momento em que as folhas mudam de casa.
Algumas pessoas chamam isso de morrer.

- E todos nós vamos morrer? - perguntou Folha

- Vamos sim - respondeu Daniel - Tudo morre.
Grande ou pequeno, fraco ou forte, tudo morre.
Primeiro cumprimos a nossa missão.
Experimentamos o sol e a lua, o vento e a chuva.
Aprendemos a dançar e a rir. E, depois morremos.

- Eu não vou morrer! - exclamou Folha, com determinação -
Você vai, Daniel?

- Vou sim... Quando chegar meu momento.

- E quando será isso???

- Ninguém sabe com certeza. - respondeu Daniel

A Folha notou que as outras folhas continuavam a cair.
E pensou: "Deve ser o momento delas." Ela viu que algumas
folhas reagiam ao vento, outras simplesmente se entregavam
e caíam suavemente

Não demorou muito para que a árvore estivesse quase despida.

- Tenho medo de morrer. - disse Folha a Daniel -
Não sei o que tem lá embaixo.

- Todos temos medo do que não conhecemos. Isso é natural.
- disse Daniel para animá-la - Mas você não teve medo quando a
primavera se transformou em verão. E também não teve medo
quando o verão se transformou em outono. Eram mudanças
naturais. Por que deveria estar com medo da estação da morte?

- A árvore também morre? - pergu

- Para onde vamos quando morrermos?

- Ninguém sabe com certeza... É o grande mistério.

- Voltaremos na primavera?

- Talvez não, mas a Vida voltará.

- Então qual é a razão para tudo isso? - insistiu a Folha -
Por que viemos pra cá, se no fim teríamos de cair e morrer?

Daniel respondeu no seu jeito calmo de sempre:

- Pelo sol e pela lua. Pelos tempos felizes que passamos juntos.
Pela sombra, pelos velhinhos, pelas crianças. Pelas cores do
outono, pelas estações. Não é razão suficiente?

Ao final daquela tarde, na claridade dourada do crepúsculo,
Daniel se foi. E caiu a flutuar. Parecia sorrir enquanto caía.

- Adeus por enquanto. - disse ele à Folha.

E depois, Folha ficou sozinha, a única folha
que restava no galho.

A primeira neve caiu na manhã seguinte.
Era macia, branca e suave. Mas era muito fria.
Quase não houve sol naquele dia... E foi um dia muito curto.
A Folha se descobriu a perder a cor, a ficar cada vez mais frágil.
Havia sempre frio e a neve passava sobre ela.

E quando amanheceu veio vento que arrancou a Folha de seu
galho. Não doeu. Ela sentiu que flutuava no ar, muito serena.

E, enquanto caía, ela viu a árvore inteira pela primeira vez.

Como era forte e firme! Teve a certeza de que a árvore viveria por
muito tempo, compreendeu que fora parte de sua vida.
E isso deixou-a orgulhosa.

A Folha pousou num monte de neve. Estava macio, até mesmo
aconchegante. Naquela nova posição, Folha estava mais
confortável do que jamais se sentira. Ela fechou os olhos e
adormeceu. Não sabia que a primavera se seguiria ao inverno,
que a neve se derreteria e viraria água. Não sabia que a
folha que fora, seca e aparentemente inútil, se juntaria
com a água e serviria para tornar a árvore mais forte.
E, principalmente, não sabia que ali, na árvore e no solo,
já havia planos para novas folhas de primavera.